História Oral - Mirella Custódio Nazaré

PLANO BRASIL NOVO E O SEU CONTEXTO HISTÓRICO editar

Relatório apresentado como parte das exigências da disciplina de História do Brasil II ministrada pelo Prof. Dr. Paulo Eduardo Teixeira.

INTRODUÇÃO editar

O relatório aqui apresentado conta com as memórias de moradores da cidade de Santos - São Paulo, durante a implantação do Plano Brasil Novo, regido pela ministra da economia do governo Collor,  Zélia Cardoso de Mello. O plano econômico, popularmente conhecido como Plano Collor, tinha como objetivo o controle da hiperinflação da época. Em conjunto com a abertura do mercado nacional às importações e o início de um programa nacional de desestatização, o plano contava com o confisco da poupança populacional, anunciado pelo presidente no dia 16 de março de 1990.

Durante o decorrer desta atividade, serão tratados os impactos econômicos e psicológicos sofridos pelo povo em relação ao plano supracitado, expondo a memória de dois irmãos, Paulo Custódio Nazaré e Augusto Pedro Nazaré Filho, que tinham no período 19 e 28 anos, respectivamente. Ambos eram moradores do canal 6 de Santos e tem lembranças vívidas do que ocorreu.

OBJETIVO editar

Com esse trabalho, procuro associar o desenrolar do Plano Brasil Novo,  fundado durante o governo Collor, à vida da população, analisando o histórico econômico do país e levando o confisco da poupança como desenlace do relatório.

É importante salientar que o combinar das reações do mercado com a memória dos sujeitos escolhidos aqui como representantes da população, leva em consideração o lócus dos mesmos.


DESENVOLVIMENTO editar

Para se entender de forma clara o contexto do governo Collor, é necessário fazer um panorama do quadro político econômico brasileiro em meados de 1980. Após o início da abertura política, chamada de “lenta, gradual e segura”, no ‘governo’ Ernesto Geisel, alguns mecanismos arbitrários da ditadura começaram a ser extintos, provocando eleições diretas para os governos estaduais e desencadeando a vitória da oposição em 1982. O êxito nas candidaturas lançadas abriram caminho para planos amplos, como por exemplo, as eleições presidenciais pelo voto popular. A popularização do termo “voto direto”, deu título ao movimento que defendia a participação popular na eleição do próximo presidente da república.

A proposta de Emenda Constitucional n°05/1983, que visava o restabelecimento das eleições diretas, foi colocada em voto no dia 25 de abril de 1984; teve 298 votos a favor, 65 contra e 113 ausentes no plenário, precisando de 320 votos, para ser encaminhada ao Senado Federal.

Após a presente derrota da, conhecida popularmente como, Emenda Dante de Oliveira, as eleições presidenciais de 1985 foram realizadas de forma indireta. O candidato Tancredo Neves (PMDB) foi eleito presidente da república, pelo Colégio Eleitoral, após disputar o cargo com Paulo Maluf, que perdeu de 480 votos a 180. Tancredo se torna então o primeiro civil eleito após o golpe de 1964.

Paulo Custódio Nazaré, sujeito escolhido para contribuir com o relatório aqui apresentado, relata em áudio que pouco tempo depois do resultado da eleição, Tancredo ficou extremamente doente. Paulo diz que lembra dos boletins diários sobre o estado de saúde do  presidente eleito, que passavam no noticiário da TV aberta. Realmente, Tancredo Neves enfrentava uma infecção generalizada gerada por um possível tumor e após passar por procedimentos cirúrgicos, faleceu em 21 de abril de 1985, por complicações pós-operatórias.

Durante o período que o então presidente  estava internado, seu vice José Sarney de Araújo Costa foi declarado presidente interino, e após o falecimento de Tancredo Neves, foi efetivado ao cargo. A posse de Sarney contrariava a vontade de vários que ocupavam cargos políticos e ainda a indicação de outro candidato para presidente foi levantada como pauta, contudo, José tomou o encargo do país em 15 de março de 1985. Inicialmente, o mandato dele deveria durar seis anos, mas o seu encargo acabaria em 1990. O plano de governo do advogado e presidente da república, José Sarney, contava com a então chamada ‘remontagem da democracia’.

No tempo em que o país estava sob seu poder foram efetivados planos a favor do trabalhador como o seguro-desemprego e o vale-transporte; o governante também se tornou um dos precursores do Mercosul. Além disso, um de seus movimentos mais populares, foi a aprovação do ‘Emendão’, uma emenda constitucional que proveu voto aos analfabetos e o funcionamento legal de partidos com orientações comunistas e socialistas, e por fim restabeleceu as diretas para todos os cargos eletivos além de presidente. Porém, ao final de seu mandato, o presidente era consideravelmente impopular.

Na economia, o governo de José Sarney foi um fracasso. O revés do Plano Cruzado, que afigurou resolver a situação econômica só confirmou a incapacidade do poder de reverter a inflação e frear a situação atual do país. Com o Plano Cruzado II o panorama econômico só piorou e o povo brasileiro se sentiu enganado mais uma vez, pois a inflação havia aumentado quase 2000%.

Como resultado disso, Sarney finalizou seu governo com incontáveis inimigos políticos, além das especulações de corrupção. Assim, entregou seu cargo sem conseguir assentar um sucessor, tornando as eleições de 1989 fervorosas.

Agora que a exposição da conjuntura foi realizada, entraremos no contexto do governo Fernando Collor de Mello. O candidato já havia construído sua trajetória política em Alagoas antes de se eleger para presidente da república. Fernando foi nomeado prefeito de Maceió de 1979 até 1982, deputado federal em 1982 até 1987, e por fim, governador de Alagoas em 1987. Ainda, o político não terminou seu último mandato para poder participar das eleições presidenciais de 1989. Sua campanha eleitoral contava com a construção da imagem de um jovem justiceiro e o candidato procurava reforçar sua imagem de “caçador de marajás” e outsider.

Durante todo o seu processo eleitoral, Fernando também aparentava certo nível de inimizade com Sarney, ambos trocavam indiretas através de entrevistas e discursos públicos, e carregaram esse antagonismo por meses. Collor passou para o segundo turno nas eleições presidenciais, contra o candidato Luiz Inácio Lula da Silva,  com 30,47% dos votos.

Paulo, nosso entrevistado, conta que lembra da vitória de Collor contra Lula com quase 54% dos votos no segundo turno. Ele cita que Fernando foi o presidente eleito mais jovem até a data e que também foi o primeiro eleito democraticamente após a ditadura. Ambos os irmãos Paulo e Augusto lembram de Zélia Cardoso, ministra da economia do governo Collor, um deles até cita que a política foi casada com Chico Anysio.

A economista Zélia Cardoso de Mello foi uma das pessoas que desenvolveu o plano “Brasil Novo”. Após a economia do país afundar como nunca antes visto durante o governo de José Sarney, a insatisfação do povo era fundamentada, então agora, com o início de um novo mandato, a esperança de uma mudança era de se esperar.

Nesse contexto, o primeiro feito de Collor após tomar posse foi lançar, conjuntamente com a sua ministra da economia, em março de 1990, o popularmente conhecido “Plano Collor”. Essa jogada econômica tinha como objetivo a estabilização monetária mas, sem dúvidas, foi uma medida de choque.

Aquele plano contava com o corte de gastos públicos através da demissão de funcionários públicos, fechamento de empresas estatais, demissão de funcionários públicos, congelamento de salários e mais. A alteração da moeda de Cruzado Novo para Cruzeiro (NCz $1,00 = Cr $1,00)  também foi uma medida desesperada para frear a inflação. Mas o que mais gerou indignação e revolta aos cidadãos brasileiros foi o confisco das cadernetas de poupança e de contas correntes que haviam depósitos maiores que $50mil Cruzeiros por um período de dezoito meses.

Um dos irmãos entrevistados, o mais novo, Paulo, expõe sua experiência. Ele confirma que em março de 90, Zélia e Collor confiscaram o dinheiro do povo, incluindo o dele. Ele comenta que tinha sido mandado embora da Cargill, uma empresa de serviços portuários, e que lembra exatamente que o dinheiro que tinha recebido estava depositado no Banco Antonio de Queiroz, no CDB, Certificado de Depósito Bancário, um tipo de depósito a prazo da época.

Ele comenta que ia até o centro da cidade quase todos os dias, só para ver a valorização do saldo na conta. Quando o confisco aconteceu, relata ter ficado muito nervoso e chateado. Disse que a inflação na época beirava os 30% ao mês ou até mais do que isso, e que com o dinheiro que tinha guardado conseguiria comprar uma CB 400, que na época era uma das melhores motocicletas do mercado. No momento em que conseguiu retirar o dinheiro, depois de quase seis meses do confisco, ele afirma que o valor não seria suficiente nem para adquirir uma Caloi 10. Paulo defende que desvalorizaram a moeda de tal maneira que ele tomou um prejuízo quase imensurável.

Ambos Paulo e Augusto se recordam das notícias que tomavam conta da TV aberta, muitas pessoas endividadas, suicídios e um desespero generalizado. Augusto relata que foi um golpe duro na vida do povo brasileiro, diz que normalmente a poupança rendia muito e que quem colocava a renda lá ganhava um ‘dinheirão’ e que da noite pro dia ficou sem nada, quando as pessoas se deram conta, o dinheiro já estava preso e não tinha muito o que fazer. Augusto diz que acredita que nem na conta o dinheiro ficava. Lembra de pessoas doentes e que a ‘pane’ no povo era real mas que apesar disso, em casa não sentiram profundamente esse baque por não terem muito dinheiro em poupança.

Durante o primeiro mês, as medidas tomadas surtiram efeito, mas após isso a inflação continuou subindo como se nada tivesse acontecido. Seguindo esse cenário, a comoção nacional foi imensa, a mudança não foi aceita.  Em maio de 1931 a ministra Zélia Cardoso foi demitida do seu cargo.

Além da gigantesca crise econômica e da desaprovação popular, Collor era alvo de suspeitas de desvio de dinheiro público. O último triz para a população brasileira foi quando seu irmão caçula, Pedro Affonso Collor de Mello, o acusou de estar envolvido em um enorme esquema junto com PC Farias, seu então tesoureiro, e mais sete pessoas. A acusação em questão envolvia corrupção ativa, corrupção passiva, falsidade ideológica e supressão de documentos.

Essas acusações trouxeram à tona o plano de impeachment e o, maior que nunca, descontentamento do brasileiro e por volta de 1992 vários movimentos populares tomaram conta das ruas. Os atos tinham como principal objetivo demonstrar aborrecimento e pedir o impeachment do presidente. O movimento, majoritariamente organizado por jovens, ficou conhecido popularmente como ‘Os Caras Pintadas’, pois os manifestantes tinham palavras de ordem pintadas com tintas coloridas no rosto.

Paulo, o entrevistado, lembra que quase no fim de 1992, o processo de impeachment aconteceu, causado por um misto de Plano Collor e denúncias de corrupção. Ele cita também que apesar disso, o então presidente renunciou antes de ser destituído de fato, e que quem assumiu seu lugar foi Itamar Augusto Cautiero Franco.

Efetivamente, foi isso que aconteceu. No dia 29 de setembro de 1992, Fernando Collor foi afastado de seu cargo por conta das acusações supracitadas e no dia 29 de dezembro do mesmo ano, seu cargo foi transferido para Itamar. Collor perdeu seus direitos políticos por oito anos, e mesmo assim, quinze anos depois, em 2007, foi eleito senador de Alagoas e ocupa esse cargo político até os dias de hoje.


CONCLUSÃO editar

Procurei aqui, unificar as lembranças dos meus sujeitos à história do Brasil, entre 1982 e 1992. A partir dos fatos supracitados, conclui-se que a memória e as histórias de vida de Paulo Custódio Nazaré e Augusto Pedro Nazaré Filho, foram fiéis aos objetivos colocados na pesquisa.

Acredito que, apesar dos seus pesares, a memória individual para a construção da memória coletiva de um país é indispensável.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS editar

FERREIRA Jorge. O presidente acidental: José Sarney e a transição democrática. In.: FERREIRA, Jorge e DELGADO, Lucilia de Almeida Neves (orgs.). O Brasil Republicano: o tempo da Nova República – da transição democrática à crise política de 2016. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018, p. 55-56."

JÚNIOR, Brasílio Sallum. O governo e o impeachment de Fernando Collor de Mello. In.: FERREIRA, Jorge e DELGADO, Lucilia de Almeida Neves (orgs.). O Brasil Republicano: o tempo da Nova República – da transição democrática à crise política de 2016. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018, p. 164.


COMENTÁRIOS editar

Acredito que a maior dificuldade encontrada durante a elaboração do trabalho, foi encontrar o momento certo de encaixar as memórias dentro da narrativa. Por ter feito o relatório de forma individual, não me deparei com problemas em relação à organização do grupo ou a distribuição de tarefas entre os integrantes.