Analise de Endemicidade

Resumo sobre o Método

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O método de Análise de Endemicidade (Endemicity Analysis) (AE) foi originalmente proposto por Szumik et al. (2002)[1] (aprimorado por Szumik & Goloboff 2004[2] e Aagesen et al. 2013[3]) como um critério de otimalidade para identificação de áreas de endemismo, por meio da congruência na distribuição geográfica de diferentes espécies. A AE é implementada pelos softwares NDM e VNDM (Goloboff 2001[4]; Szumik et al. 2006[5]).

Diferente de outros métodos propostos previamente, a AE leva em consideração a posição das espécies no espaço por meio de coordenadas geográficas[1]; portanto, é um método espacialmente explícito. A área de estudo é dividida em quadrículas (cujas dimensões podem ser escolhidas pelo usuário), sendo as áreas de endemismo estimadas com base no padrão de distribuição das espécies nesse conjunto de quadrículas.

A AE avalia por meio de um índice de endemicidade (IE), quantos e quão endêmicos são os táxons de uma determinada área. O IE de cada táxon varia de 0 a 1, sendo o valor máximo atingido quando o táxon ocorre em todas as quadrículas da área e apenas nelas.

O somatório dos IE de todos os táxons de uma determinada área será o seu valor de endemicidade (VE). Assim, dois fatores contribuem para o VE de uma área: o número de espécies que ela possui e o grau de congruência entre a distribuição das mesmas. Serão suportadas como áreas de endemismo aquelas que tenham os maiores VE. A busca por essas áreas é realizada pelo algoritmo do NDM (por meio de buscas heurísticas), e a visualização das áreas definidas é feita através do VNDM.

Após os aprimoramentos feitos ao NDM/VNDM[2], o IE de um táxon x para uma área A é calculado da seguinte maneira[5]:

 
Exemplo de como se aplica o índice de endemicidade (IE) na Análise de Endemicidade (AE). Considerando-se as quadrículas coloridas, a espécie vermelha possui o maior IE, uma vez que está restrita a essas quadrículas e ocorre em todas elas. O segundo maior IE será da espécie verde, também restrita às quadrículas coloridas, embora não ocorra em todas elas. Por fim, o menor IE será dado à espécie azul, a qual, embora ocorra em todas as quadrículas coloridas, também está presente fora delas.

IEx = p+(i.Fi)+(a.Fa) / t+(o/Fo)+(d/Fd)+(n/Fn)

p: nº de células de A onde x está presente.

i: nº de células de A onde a ocorrência de x é inferida pelo algoritmo.

a: nº de células de A onde a ocorrência de x é assumida (determinada pelo usuário).

t: nº total de células de A (“tamanho de A”).

o: nº de células fora de A, mas adjacentes a ela, onde x está presente.

d: nº de células fora de A, mas adjacentes a ela, onde a ocorrência de x é assumida.

n: nº de células fora de A e não-adjacentes a ela, onde a ocorrência de x é assumida.

Fi: fator para presenças inferidas dentro de A (default 0.50).

Fa: fator para presenças assumidas dentro de A (default 0.75).

Fo: fator para presenças observadas fora de A (default 0.50).

Fd: fator para presenças assumidas adjacentes a A (default 2.00).

Fn: fator para presenças assumidas não-adjacentes a A (default 0.50).

Os fatores (F) são utilizados para tornar os termos a eles relacionados mais ou menos influentes. Fi e Fa variam de 0 a 1, enquanto Fo, Fd e Fn devem ser maiores que 0. O valor padrão (default) de cada fator pode ser alterado pelo usuário.

Base teórica

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As áreas de endemismo são consideradas as menores unidades de estudo da Biogeografia Histórica. Os padrões observados por meio das áreas de endemismo constituem a base para formulação de hipóteses sobre os processos que deram origem à biota de uma região[6]. O método de Análise de Endemicidade se baseia no conceito de áreas de endemismo proposto por Platnick (1991)[7], segundo o qual uma área de endemismo é definida pelos limites de distribuição congruentes de duas ou mais espécies.

Uma vez que a distribuição geográfica de um táxon é resultado da atuação de fatores históricos e atuais, distribuições semelhantes entre dois ou mais táxons seriam resultantes de fatores históricos/atuais similares agindo de maneira similar[1]. A Análise de Endemicidade se propõe a identificar esses padrões de distribuição entre táxons (as áreas de endemismo), sem levar em conta os possíveis processos causais (vicariância, dispersão, extinção, etc.)[1].

Premissas

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O método de AE possui as seguintes premissas:

1- A amostragem de localidades de ocorrência dos táxons (pontos georreferenciados) é suficiente para representar as distribuições geográficas desses táxons – em outras palavras, não há lacunas ou vieses de amostragem nos dados de entrada, fatores estes que podem causar ruído nos resultados da análise (veja em “Limitações”);

2- A presença de um ponto de registro de um táxon em uma quadrícula é interpretada como a presença deste táxon em toda a área da quadrícula;

3- Os táxons devem possuir áreas de distribuição geográfica pequenas em comparação com o tamanho da área de estudo – uma espécie pode ser considerada tanto amplamente distribuída, como de distribuição restrita, de acordo como tamanho da área de estudo em questão;

4- Os táxons endêmicos devem possuir simpatria extensiva, porém, não completamente congruente – não há sobreposição total entre as áreas de distribuição dos táxons;

5- As áreas de endemismo possuem bordas difusas, onde nem todos os táxons endêmicos ocorrem – somente uma parte deles é encontrada nessas bordas, como consequência da premissa número 3.

Aplicações

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O método de AE é utilizado para estimar a localização de áreas de endemismo para o táxon ou grupo de táxons analisados, dentro de uma área de estudo delimitada (p. ex. um continente, um bioma, uma cadeia de montanhas, etc.). A delimitação de áreas de endemismo pode contribuir para o direcionamento de esforços de pesquisa e conservação para localidades específicas dentro de uma grande paisagem geográfica. Além disso, quando aliada a informações de outras fontes (como paleontologia, geomorfologia e dados climáticos) contribui para o avanço no entendimento sobre os fatores que determinam a evolução e organização espacial da biota.

Limitações

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Quando o método de AE foi proposto[1], possuía duas limitações principais decorrentes do algoritmo usado. A primeira limitação estava na impossibilidade de se reconhecer áreas de endemismo disjuntas, ou seja, toda área de endemismo deveria ser formada por quadrículas em contato entre si. A segunda limitação estava relacionada com o fato de que as espécies só poderiam ser classificadas como presentes ou ausentes para cada quadrícula.

Após aprimoramentos[2] essas limitações foram sanadas, sendo possível o reconhecimento de áreas de endemismo disjuntas e a classificação de uma espécie como presente, ausente, assumida ou inferida em determinada quadrícula – a ocorrência “assumida” é definida pelo usuário, enquanto a “inferida” é definida pelo algoritmo como parte da análise. Uma limitação presente na AE até recentemente era a impossibilidade de se calcular um consenso. Muitas vezes a análise dos dados resultava em dezenas ou centenas de conjuntos de áreas de endemismo com pequenas variações entre si no que se refere ao número/disposição de células e espécies. A escolha do conjunto considerado mais adequado cabia ao usuário e tinha que ser feita manualmente, o que demandava muito tempo. Essa grande limitação técnica foi posteriormente resolvida[3], tornando o VNDM capaz de criar um consenso entre esses conjuntos de áreas.

Atualmente, são duas as maiores limitações da AE, não exclusivas a este método, mas também presente em outros métodos. A primeira limitação está no fato de que lacunas e vieses de amostragem podem afetar os resultados, uma vez que estes fatores atentam contra a premissa número 1 informada anteriormente. A segunda limitação está relacionada ao uso de quadrículas como unidade básica de análise[1][8]. A presença de um único ponto de registro de uma espécie em uma quadrícula é interpretada como uma presença em toda a quadrícula. Caso o ponto esteja localizado no limite entre duas ou mais quadrículas adjacentes, o táxon será interpretado como presente em todas as quadrículas que compartilham a borda. Consequentemente, as áreas de endemismo podem ser superestimadas dependendo do tamanho das quadrículas. Da mesma maneira, se quadrículas muito pequenas forem utilizadas, as áreas de endemismo podem ser subestimadas, ou mesmo não estimadas pelo método de AE.

Tutorial de uso

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Um manual sobre o NDM/VNDM está disponível no website da Fundação Miguel Lillo: http://www.lillo.org.ar/phylogeny/endemism/Manual_VNDM.pdf

Referências

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  1. 1,0 1,1 1,2 1,3 1,4 1,5 Szumik, C.A., F. Cuezzo, P. Goloboff & A.E. Chalup. 2002. An optimality criterion to determine areas of endemism. Systematic Biology 51(5): 806–816. http://dx.doi.org/10.1080/10635150290102483
  2. 2,0 2,1 2,2 Szumik, C. & P.A. Goloboff. 2004. Areas of endemism: an improved optimality criterion. Systematic Biology 53(6): 968–977. http://dx.doi.org/10.1080/10635150490888859
  3. 3,0 3,1 Aagesen, L. C. Szumik & P.A. Goloboff. 2013. Consensus in the search for areas of endemism. Journal of Biogeography 40(11): 2011–2016. http://dx.doi.org/10.1111/jbi.12172
  4. Goloboff, P. 2005. NDM/VNDM ver. 2.5. Programs for identification of areas of endemism. Disponível em http://www.lillo.org.ar/phylogeny/endemism/. Acessado em 30/10/2016
  5. 5,0 5,1 Szumik, C., D. Casagranda & S.R. Juñent. 2006. Manual de NDM/VNDM: Programas para la identificación de áreas de endemismo. Instituto Argentino de Estudios Filogenéticos 5(3): 1–26. Disponível em http://www.lillo.org.ar/phylogeny/endemism/Manual_VNDM.pdf. Acessado em 30/10/2016
  6. Carvalho, C.J.B. 2010. Áreas de Endemismo; pp. 41–51, in: C.J.B. Carvalho & E.A.B. Almeida (org.). Biogeografia da América do Sul: Padrões & Processos. São Paulo: Roca.
  7. Platnick, N.I. 1991. On areas of endemism. Australian Systematic Botany 4: 11–12i.
  8. Oliveira, U., A.D. Brescovit & A.J. Santos. 2015. Delimiting Areas of Endemism through Kernel Interpolation. PLoS ONE 10(1): e0116673. http://dx.doi.org/10.1371/ journal.pone.0116673