Ciência Política Cásper/Microfísica do Poder
Discurso: Saber e Poder
editarEssas regras definem não a existência muda de uma realidade, não o uso canônico de um vocabulário, mas o regime de objetos (...) consiste em não mais tratar os discursos como conjunto de signos (elementos significantes que se remetem a conteúdos ou representações), mas como práticas que formam sistematicamente os objetos de que falam. Certamente os discursos são feitos de signos; mas o que fazem é mais que utilizar esses signos para designar coisas. É esse 'mais' que é preciso fazer aparecer e que é preciso descrever." (FOUCAULT, Michel. Arqueologia do Saber. Rio de Janeiro: Forense, 1986 p. 56)
"[...] o discurso não é simplesmente aquilo que traduz as lutas ou os sistemas de dominação, mas aquilo por que, pelo que se luta, o poder do qual queremos nos apoderar. (FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. 13.ed. São Paulo: Loyola, 2006. p. 9-10)
“O tipo de análise que pratico não trata do problema do sujeito falante, mas examina as diferentes maneiras pelas quais o discurso desempenha um papel no interior de um sistema estratégico em que o poder está implicado e para o qual o poder funciona.[...] O poder é alguma coisa que opera através do discurso, já que o próprio discurso é um elemento em um dispositivo estratégico de relações de poder.” (FOUCAULT, Michel., Ditos e Escritos – vol IV: estratégia - poder – saber. 3.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2012 p. 247)
“o que faz com que o poder se mantenha e que seja aceito é simplesmente que ele não pesa só como a força que diz não, mas que de fato ele permeia, produz coisas, induz ao prazer, forma saber, produz discurso” (FOUCAULT, MIchel. Microfísica do poder. Rio de Janeiro, Ed. Graal. 1979, p. 8).
Dispositivos
editarPara Foucault: "Por este termo tento demarcar, em primeiro lugar, um conjunto decididamente heterogêneo que engloba discursos, instituições,organizações arquitetônicas, decisões regulamentares, leis, medidas administrativas, enunciados científicos, proposições filosóficas, morais, filantrópicas. Em suma, o dito e o não dito são os elementos do dispositivo. O dispositivo é a rede que se pode estabelecer entre esses elementos" (FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder Rio de Janeiro: Graal. p.243-276. 2000, p.244)
[é um operador metodológico que auxilia o pesquisador na análise das práticas discursivas, de poder e de subjetivação]
Sobre os dispositivos da sociedade disciplinar : "A disciplina aumenta as forças do corpo (em termos econômicos de utilidade) e diminui essas mesmas forças (em termos políticos de obediência). Em uma palavra: ela dissocia o poder do corpo; faz dele por um lado uma 'aptidão', uma 'capacidade' que ela procura aumentar; e inverte por outro lado a energia, a potência que poderia resultar disso, e faz dela uma relação de sujeição estrita. Se a exploração econômica separa a força e o produto do trabalho, digamos que a coerção disciplinar estabelece no corpo o elo coercitivo entre uma aptidão aumentada e uma dominação acentuada. (FOUCAULT, Michel. História da sexualidade 3: o cuidado de si. 7. ed. Rio de Janeiro: Graal, 2002 p.119)
A sexualidade é o nome que se pode dar a um dispositivo histórico: não à realidade subterrânea que se apreende com dificuldade, mas à grande rede da superfície em que a estimulação dos corpos, a intensificação dos prazeres, a incitação ao discurso, a formação dos conhecimentos, o reforço dos controles e das resistências, encadeiam-se uns aos outros, segundo algumas grandes estratégias de saber e de poder. (FOUCAULT, Michel. História da sexualidade I: A vontade de saber. 13ª edição, Rio de Janeiro: Edições Graal, 1988. p. 99).
Agamben, também utiliza a noção de dispositivo, mas de um modo um pouco mais amplo a de Foucault: “... chamarei literalmente de dispositivo qualquer coisa que tenha de algum modo a capacidade de capturar, orientar, determinar, interceptar, modelar, controlar e assegurar os gestos, as condutas, as opiniões e os discursos dos viventes.” (AGAMBEN, Giorgio. O que é um dispositivo? Revista outra travessia, n. 05. Florianópolis, 2005, p. 13)
Biopolítica e Governamentalidade
editarComo tecnologia do poder, a biopolítica procura “[...]racionalizar os problemas postos à prática governamental pelos fenômenos próprios de um conjunto de viventes constituídos em população: saúde, higiene, natalidade, longevidade, raça” (FOUCAULT, Michel. Nascimento da biopolítica São Paulo: Martins Fontes. 2008, p.431).
"a proliferação, os nascimentos e a mortalidade, o nível de saúde, a duração da vida, a longevidade, com todas as condições que podem fazê-los variar; tais processos são assumidos mediante toda uma série de intervenções e ‘controles reguladores: uma biopolítica da população’ (FOUCAULT, Michel. História da sexualidade, 1: a vontade de saber. Rio de Janeiro: Graal. 2003. p.131)
A governamentalidade são as “táticas de governo que, a cada instante, permitem definir o que deve ser do âmbito do Estado e o que não deve, o que é público e o que é privado, o que é estatal e o que é não estatal” [...] o conjunto constituído pelas instituições, procedimentos, análises e reflexões, os cálculos e as táticas que permitem exercer uma relação de poder em que (1) o alvo seria a população; (2) a economia política seria a principal forma de conhecimento; e (3) os dispositivos de segurança seriam o instrumento técnico essencial. (FOUCAULT, Michel. Segurança, território e população São Paulo: Martins Fontes. 2008 p.143-145)
Governamentalidade = Problematização (identificação de um "problema" + Normalização (procedimentos aos quais uma população deve adequar-se) + Objetivação (regulamento, atividades e instituições criadas gestão por meio da estatística -coletar e analisar dados)
"a criança, o doente, o louco, o condenado se tornaram, cada vez mais facilmente a partir do século XVIII e segundo uma via que é a da disciplina, objeto de descrições individuais e de relatos biográficos. Esta transcrição por escrito das existências reais ... funciona como processo de objetivação e de sujeição. (FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: a história da violência nas prisões Petrópolis, RJ: Vozes. 1999, p. 159)
Para reflexão
editarUm exercício interessante é observar o que acontece com o personagem Kaspar Hauser em "O Enigma de Kaspar Hauser" de Werner Herzog
Como pensar o título do livro de Sueli Carneiro, "O dispositivo da racialidade"
A partir de Agamben, como pensar o uso do VAR (Video Assistant Referee) no futebol?