Conselhos de Políticas Públicas (Roberta Melo)

Quando pensamos no funcionamento dos Conselhos de direitos, como executores da Políticas Públicas, encontramos uma série de autores que defendem seu funcionamento como parte da técnica de responsabilização, instrumento moderno de cogestão que permite ao Estado executar em parceria com as entidades organizadas da sociedade civil as diretrizes estabelecidas em lei. Através dos conselhos e agências é possível: implantar, gerir, regulamentar, fiscalizar, mediar, desenvolver e punir: empresas, fundos e setores como a saúde, educação e assistência, etc. e zelar pelo cumprimento e execução da lei, de forma horizontal e social, com maior transparência e rapidez. É quase um consenso que esta forma de gestão em tese permita que os conselhos e agências: supervisionem, fiscalizem, executem, multem ou ajam como ombudsman determinando medidas corretivas, como o rompimento de um contrato e podendo ainda fazer a cassação de mandatos ou o processo de impeachment; embora funcional, nem sempre é tão democrática e eficaz sendo muitas vezes engolida pela maquina estatal.

É importante lembrar que no conceito moderno de administração, não há Certo ou Errado, há Modelos de gestão que dão certo em certas épocas e ambientes; por isso optamos por fazer um recorte nos aspectos que podem ser melhorados, nessa prática parlamentar vista pela maioria dos autores como exercício de excelência da democracia; mas que também tem sido alvo de muitos estudos acadêmicos, que contestam sua eficiência enquanto processo realmente representativo da sociedade e do acesso da população à atuação nos Conselhos de Políticas Públicas. Como já foi dito, os Conselhos são uma forma moderna de gestão, que proporcionam o controle misto sobre as ações do Estado, permitindo a participação externa dos representantes diretos da sociedade no meio decisório, proporcionando em sua execução os mecanismos de accountability ou responsabilização. Essa atualização de modelo ocorre no Brasil no fim dos anos 80, com o amadurecimento da democracia, gestores técnicos mais preocupados com a gestão de resultados, com o fortalecimento da democracia no país e no intuito de implantar e resguardar as políticas públicas, passam a defender a criação dos conselhos. Podemos destacar a atuação da Sra. Dorotéia Werneck, que lutou pela criação do Seguro desemprego e posteriormente pela destinação de recursos a um (FAT) Fundo de Amparo ao Trabalhador, garantindo sua continuidade; e que junto com o Sr. Almir Pazzianoto e a classe política defenderam que esse fundo previdenciário do trabalhador fosse gerido por um conselho, criando o CONDEFAT, isso tudo em meio a discussão da Carta Magna de 88.

“Se anteriormente o modelo concebia conselhos comunitários e populares, o modelo atual institui novas atribuições e altera seu perfil: não mais conselhos atuantes no âmbito do microterritório, mas conselhos setoriais paritários em diversas esferas de poder e com poderes deliberativos, alocativos e regulatórios. A emergência de conselhos setoriais, superando o formato anterior que os identificava exclusivamente com o plano do território, representa um avanço. O formato setorial dos conselhos permite, pelo menos potencialmente, a superação de desigualdades regionais e uma compreensão mais global da política, permitindo uma atuação mais consistente na definição de diretrizes de políticas que caminhem no sentido da equidade e efetividade.” [1]

Falhas de Funcionamento dos Conselhos

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Sabemos que os Conselhos foram criados como forma de fiscalizar e controlar as ações do Estado, de forma direta, pavimentando o caminho de democratização que foi constitucionalmente aberto em 1988. Mas até hoje os principais obstáculos para uma atuação mais consistente dos conselhos estão ligados às dificuldades para realizar e ampliar a participação, viabilizar o envolvimento e o compromisso de atores centrais, tanto governamentais quanto não-governamentais, e instituir mecanismos de controle e deliberação efetivos que dará condições para que a dimensão igualitária e deliberativa do conselho possa, de fato, garantir maiores níveis de eficiência, efetividade e equidade nas políticas sociais. Talvez a maior dificuldade disso seja o fato de que em partes, representando o Estado, os conselhos são geridos e secretariados, por funcionários públicos e funcionam conforme o grau de oferta. Vejamos por exemplo os conselhos municipais ligados a Assistência, eles se reúnem em dias e horários de interesse dos servidores, nos espaços públicos onde esses trabalham; já os representantes das ONGs, como parte da sociedade civil organizada, normalmente são empregados das organizações e deveriam naquele horário estarem exercendo outras funções, e devem ter todos os seus custos arcados pelo respectivo empregador, como transporte e alimentação, caso esse se interesse em manter esse representante. E como as ONGs concorrem entre si, na busca por financiadores e mantenedores, elas não são membros de uma só vontade e direção, ou donas de uma visão comum que permita compartilhar os interesses e custos com outra ONG concorrente, para que essa a represente devidamente. A situação se agrava quando, mesmo que diminutamente participando do conselho, esse representante empregado de um ESFL (Entidade Sem Fins Lucrativos) é designado a fazer parte de um grupo de trabalho, o servidor mais uma vez estará em horário de serviço todavia o representante terá de acumular funções, se for possível, ou desempenhar de forma ineficiente suas funções equilibrando os interesses sociais, com suas necessidades pessoais e a vontade patronal de seu empregador. E há ainda os custos da representação na instância maior, quem arcará com isso? Ao limitar o processo democrático à poder financeiro, sempre a pessoa com maiores recursos interesses ou disponibilidade, será a que poderá ir defender suas crenças ou a da organização que o patrocina. Logo, será mais ativa e presente na vida política.

Para resolver isso criou-se a representação por associação de classe, que consiste na junção de entes que almejam o mesmo fim, entes da mesma classe que compartilham os custos de lutar por e defender seus interesses. Mais uma vez, teoricamente é tudo muito fácil, cada qual ao juntar-se com seus semelhantes terá proporcionalmente mais facilidade ao manusear o poder político, podemos acreditar que agora o processo seria democrático e representativo. Mas há muito se discute mudanças no meio sindical sem que haja mudanças, já que não há interesse [principalmente] financeiro, e nem acesso do trabalhador à hierarquia do poder. É como ouvir dos trabalhadores, que sindicato é aquele desconto que existe 2 vezes ao ano. E sabemos que com exceção de duas ou três categorias é possível passar anos numa empresa sem que o sindicato se quer mande um informativo, ou que alguém lhe convide para fazer parte de uma chapa de diretoria. É muita pretensão chamar de democrático um processo só porque alguém vota, mas não podemos estabelecer o que, quando ou o que. Então a questão é o quanto essas entidades realmente representam os trabalhadores, no caso dos sindicatos, que estão na base da pirâmide social e são quem mais precisam das aplicações das políticas públicas? Lógico que isso não acontece com as entidades patronais, essas sim tem verbas, representantes e até lobistas em sua estrutura para defender seus interesses. Recentemente, o PROCON de SP iniciou um grupo de trabalho para descobrir quanto da velocidade que é vendida por uma operadora de telefonia é realmente entregue, para através desse levantamento fazer uma pressão por melhoria de serviço junto a ANATEL, que pasmem, também é um conselho tendo representação de todos os setores da sociedade, tem verbas para fiscalização, poder de multar e até bem pouco tempo permitia que o consumidor tivesse garantido somente dez por cento do pacote efetivamente contratado. Claro que essa gestão mista é melhor que nada, mas o governo com sua ineficiência em gerir, mal representado por seus funcionários que uma vez concursados, dificilmente são reavaliados, pressionados pelos profissionais altamente treinados e motivados por remuneração, por resultados dos representantes setoriais e empresariais, muitas vezes opta pela indicação de partidos como os jornais mostraram em agosto 2015, e falha em proteger a população e os usuários mesmo criando diversos mecanismos de proteção. Nessa guerra entre o poder financeiro e a população, claro que sempre vence o corporativismo, hoje no caso da ANATEL, de 100% da banda larga que você contrata as empresas só precisam entregar 60%.

Nos levando a pensar se isso acontece nas relações comerciais, o que não acontece numa política voltada a saúde, assistência e educação, onde o cidadão não paga diretamente pelo serviço que receberá?

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Ainda nas falhas de funcionamento dos Conselhos, podemos citar o caso do maior proprietário de frotas de ônibus interestaduais do Brasil e 4° do mundo, que quando em 2001 resolveu montar uma companhia aérea, recebeu total apoio: dos conselhos de direitos, das agências reguladoras, dos órgãos de governo, dos bancos oficiais e de fomento, mesmo possuindo na época dívidas de milhões com o FISCO, que já eram questionadas pela justiça e listadas na relação dos maiores devedores de impostos do país. É claro que ele conseguiu concessão para montar sua empresa aérea, esse passo era importante para a sobrevivência desse grande grupo empregador brasileiro. Já que muito se falava em novas outorgas do setor de transportes terrestres, área que o proprietário do Grupo Aurea dominava com mais de 12.000 ônibus. O que infringe os direitos civis é como, além da concessão, 5 anos depois ainda lhe foi dada a autorização para ampliá-la comprando a massa falida da Varing, empresa que também chegou a ser uma das maiores devedoras do FISCO; suas rotas, algumas propriedades e a transportadora, dobrando o tamanho da empresa, mesmo inscrito na dívida ativa e com acusações de vários crimes, inclusive assassinato, que seria condenado logo depois como mandante? Nessa operação, o grupo contou ainda com aporte público, e aprovação de diversas agências e conselhos, CADE, ANAC, SDE, SEAE, e a idoneidade atestada pelo CONIT. Vale observar que no caso do Conselho Nacional de Integração de Políticas de Transporte (CONIT) a escolha dos representantes da sociedade civil se dá por designação do Presidente da República, entre representantes de usuários, de prestadores de serviços e de empresas dos setores de infraestrutura e indústria de transportes, para um período de dois anos, permitida a recondução, regulamentação semelhante aos demais conselhos de direitos. Onde cabe a pergunta, quem realmente poderia representar os usuários do setor de transportes? Como seria feita a indicação para escolha do presidente?

“Governos estaduais e federal processam as empresas de transporte dos Constantinos para receber o dinheiro A família Constantino, dona da Gol e da Varig, possui uma dívida tributária de ao menos R$ 377 milhões com a União, a maior parte acumulada no INSS por conta do não recolhimento de contribuições previdenciárias de dez empresas de ônibus do grupo. Em junho de 2006, antes da compra da Varig, ocorrida em março de 2007, a Justiça Federal em São Paulo reconheceu a existência do grupo econômico e penhorou ações da Gol para pagar as dívidas das empresas de ônibus. [2]

“GOL Obtém Financiamentos Longo Prazo junto ao BNDES São Paulo, 29 de maio de 2006 – A GOL Linhas Aéreas Inteligentes (Bovespa: GOLL4 e NYSE: GOL), a companhia aérea brasileira regular de baixo custo e de baixa tarifa, anuncia que seu Conselho de Administração autorizou sua empresa operacional, GOL Transportes Aéreos S.A., firmar um contrato de empréstimo de longo-prazo de R$75,7 milhões junto ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). O prazo do empréstimo do BNDES é de seis anos, com juros de 2,65% acima da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP, hoje fixada em 8,15%).” [3]

“RIO - A Gol enviou comunicado, na noite de quarta-feira, informando que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão do governo que fiscaliza a concorrência, aprovou hoje a aquisição da Varig pela Gol, possibilitando que as empresas possam desenvolver o transporte de passageiros e cargas livremente. Segundo a nota, em julgamento, o órgão deliberou que a operação não alterou os níveis de concorrência do mercado ou as opções dos usuários de transporte aéreo. A aquisição da Varig, anunciada em 28 de março de 2007 e aprovada pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) em 3 de abril do ano passado, já havia recebido parecer favorável da Secretaria de Direito Econômico (SDE), do Ministério da Justiça, da Secretaria de Acompanhamento Econômico (SEAE), do Ministério da Fazenda e da Procuradoria do Cade, informa o comunicado.

         [4]

Como a maioria acredito que os conselhos de direito possam ser um ferramenta democrática, eficiente e eficaz de exercício da cidadania, mas que as formas de escolha dos representantes devam ser mais amplas e acessíveis a qualquer cidadão e que, assim como há financiamento em parte do processo político e de campanha, qualquer cidadão possa ser patrocinado pela estrutura pública para ter acesso a participação em todos os conselhos. Que seja garantido por lei, uma licença de seu trabalho, para defender os interesses da população, assim como acontece com os eleitos para diretoria de sindicato e que todo candidato a representante seja qualificado como pré-requisito, gratuitamente antes de sua campanha para poder exercer o cargo no setor que representa levando em conta suas peculiaridades, seu conhecimento macro e micro sobre a região onde atua, legislação em vigor sobre o setor, técnicas de gestão administrativas, funcionamento da máquina estatal e combate a corrupção.

  1. Conselhos de políticas públicas: desafios para sua institucionalização - Carla Bronzo Ladeira Carneiro
  2. O Estado de São Paulo, 25/06/2008, Economia, p. B1
  3. site da Gol 25/06/2008 0:00 / atualizado 09/01/2012 17:40
  4. FELIPE FRISCH - O GLOBO 25/06/2008