Introdução ao Jornalismo Científico/Temas Centrais da Ciência Contemporânea/Atividade/AdrianaFarias09

A notícia selecionada para a tarefa final do módulo 4 é sobre um estudo de um grupo de cientistas brasileiros relacionado a degradação de quase metade da Amazônia a ponto de não retorno até 2050. O trabalho foi publicado na revista científica "Nature" no dia 14 de fevereiro de 2024. Para análise, optei por uma reportagem sobre o assunto da Folha de S.Paulo e outra do portal G1, ambas publicadas no dia 14 de fevereiro às 13h00.

Título Folha: Quase metade da amazônia caminha para ponto de inflexão rumo ao colapso até 2050, diz pesquisa. Linha-fina: Estudo liderado por cientistas brasileiros aponta perda de resiliência da floresta com secas extremas e desmatamento.

Título G1: Devastação na Amazônia pode chegar a ponto de não retorno até 2050, alerta estudo. Linha-fina: Pesquisa mostra que quase metade da floresta amazônica pode estar exposta a fatores de degradação que levariam a Amazônia a um processo de transformação irreversível.

Análise:

O título da reportagem da Folha destaca a ideia de "ponto de inflexão rumo ao colapso", sugerindo um momento crítico que a Amazônia poderia enfrentar até 2050. Isso cria uma sensação de urgência e alarme em relação à situação da floresta.

Por outro lado, o título do G1 fala em "ponto de não retorno", o que significa a mesma coisa, transmitindo a ideia de que a devastação poderia alcançar um estágio em que seria impossível reverter os danos. Isso também ressalta a gravidade da situação.

Ambos títulos focam para a irreversibilidade dos danos e dão ênfase na gravidade do cenário futuro. Com relação a abordagem sobre a origem do problema, a Folha menciona especificamente “perda de resiliência da floresta com secas extremas e desmatamento”, sugerindo que esses são os principais fatores que estão levando a Amazônia a um estado crítico. Isso aponta para a responsabilidade humana (desmatamento) e para fatores climáticos (secas extremas) que também estão sendo potencializados pelas atividades antropogênicas.

O G1 não aborda diretamente as causas da possível devastação, e basicamente repete na linha-fina as informações do título usando sinônimos. O texto menciona que a floresta está exposta a "fatores de degradação", que podem levar a um processo de transformação irreversível. Isso pode sugerir uma abordagem mais genérica em relação às causas da degradação, sem especificar o desmatamento ou as secas extremas.

Com relação ao estilo de linguagem, a Folha é mais técnica e direta, usando termos como “ponto de inflexão” e “perda de resiliência”, que são mais comumente encontrados em discussões científicas. O G1 utiliza uma linguagem um pouco mais dramática e generalista.

Abre Folha: Um grupo de cientistas brasileiros estima que, até o ano de 2050, de 10% a 47% da floresta amazônica estarão expostos a ameaças graves e poderão sofrer uma transição de ecossistema, com perda de resiliência da floresta e conversão a outras formas do bioma, incapazes de cumprir o papel de sumidouro de carbono desempenhado pela amazônia. É o chamado ponto de não retorno, quando a floresta já não encontra formas de retroalimentação e colapsa, total ou parcialmente, convertendo-se em outras formas de existência biológica.

Abre G1: Quase metade da floresta amazônica pode estar exposta a fatores de degradação que levariam a Amazônia a um ponto de não retorno até 2050. A conclusão é de um estudo liderado por pesquisadores brasileiros publicado na revista científica "Nature" nesta quarta-feira (14). 👉 Contexto: o ponto de não retorno é um estágio a partir do qual se inicia uma transformação irreversível. No caso da Amazônia, seria o ponto em que a floresta passaria a morrer de maneira acelerada, com modificações no bioma e extensas áreas começando um processo de colapso.

Análise:

De forma cadenciada, o título, a linha-fina e o abre do texto da Folha levam para informações diretas e precisas sobre do que se trata o estudo em questão, enquanto o G1 é mais repetitivo e generalista em como fornece a informação desde o título, a linha-fina e o abre. Por outro lado, na segunda frase do texto do G1 sabemos que se trata de um estudo publicado na prestigiosa revista “Nature”, fornecendo uma fonte específica e reconhecida para a informação apresentada. Isso aumenta a credibilidade do conteúdo, enquanto a Folha dá esse dado apenas no oitavo parágrafo da reportagem.

O abre da Folha fornece mais detalhes sobre as estimativas feitas pelos cientistas brasileiros, destacando a amplitude das ameaças (de 10% a 47% da floresta) e as possíveis consequências, como a perda de resiliência da floresta e sua conversão para outras formas de bioma. Ele também define explicitamente o “ponto de não retorno” e o descreve como um estágio crítico em que a floresta colapsa.

Por outro lado, o abre do G1 menciona brevemente que quase metade da floresta amazônica pode estar exposta a fatores de degradação, fornecendo a faixa específica de ameaças no terceiro parágrafo. Ele também define o “ponto de não retorno” como um estágio de transformação irreversível, implicando para o colapso da floresta.

Há um nível de detalhamento e complexidade da linguagem que também pode ser analisado. O abre da Folha utiliza uma linguagem mais técnica e detalhada, com termos como “transição de ecossistema” e “sumidouro de carbono”, que podem exigir um conhecimento prévio do leitor sobre esses conceitos. Mas na sequência, ao explicar o que é o ponto de não retorno, o conteúdo fica compreensível.

Descrição do método

Com relação a descrição do método do estudo, a Folha não explica a metodologia científica empregada pelo estudo. O teor da reportagem traz os principais destaques, impactos, conclusões e o que deve ser feito para mitigar a situação de acordo com o estudo. “O novo estudo conduzido pelos pesquisadores brasileiros afirma que a amazônia está cada vez mais exposta a pressões, com aumento de temperaturas, secas extremas, desmatamento e fogo, mesmo nas áreas mais centrais ou nas mais remotas. O colapso do bioma pode ser local, regional ou mesmo total, o que agravaria as mudanças climáticas, cita o estudo”.

“É preciso interromper o desmatamento e a degradação e expandir iniciativas de reflorestamento, afirmam os pesquisadores. O bioma está em nove países, uma região com 40 milhões de pessoas, das quais 2,2 milhões são indígenas de 300 etnias, aponta o estudo. A perda de floresta impacta diretamente a vida nessas comunidades”.

A reportagem também fornece informações do que os cientistas do estudo consideram como limites críticos para amazônia, como um aumento de temperatura acima de 1,5°C e desmatamento acumulado de 20% da cobertura florestal. Cita que foram usados modelos, mas não diz quais e nem de que tipo, que projetam até 2050 um aumento significativo de dias secos (de 10 a 30 dias) e da temperatura (de 2°C a 4°C). Assim, pode haver um déficit de vapor e uma crise hídrica decorrente disso.

Outra informação fornecida do estudo é que 10% da floresta amazônica têm potencial alto de transição, como para uma savanização do bioma, sobretudo em áreas associadas a fronteiras de desmatamento em lugares com projetos de grandes rodovias.

Ao comparar a descrição do método feita pelo G1, o veículo explica melhor a metodologia científica empregada. A reportagem diz que o estudo mapeou os principais fatores de estresse aos quais a Amazônia está exposta e como os diferentes tipos de degradação interagem entre si. Usa uma aspa da entrevistada Marina Hirota, professora do departamento de física da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e uma das responsáveis pela pesquisa, que explica a diferença da porcentagem de que 10% e 47% da floresta amazônica esteja exposta a ameaças graves até 2050.

Para entender o potencial de colapso da floresta amazônica a médio prazo, a reportagem do G1 mostra em formato de lista o que os pesquisadores analisaram como as principais causas de degradação do bioma, considerando especialmente o estresse hídrico, bem como a ação humana em meio a todo esse estresse que a amazônia vem sofrendo.

Ao adentrar o tópico sobre as consequências irreversíveis, o G1 também fornece em formato de lista e tópicos os três possíveis caminhos de transformação do ecossistema que o estudo projeto, como 1) floresta degradada, que se estabelece quando há a recuperação, mas em estado degradado com predomínio de espécies nativas oportunistas, como cipós e bambus; 2) savana de areia branca, evidências de satélite e de campo revelaram que as savanas de areia branca estão se expandindo onde a floresta foi destruída por incêndios. Depois do fogo, a camada superficial do solo nesses locais passa de argilosa para arenosa; 3) áreas não-florestais degradadas, ocorre em regiões em que a floresta não se recupera mais e permanece em estado de vegetação aberta, com incêndios recorrentes. Ao final, é fornecido um dado estimado de que no sul da Amazônia 5% a 6% da paisagem já se transformou em ecossistemas degradados devido ao desmatamento e incêndios.

Ademais, a Folha oferece dois infográficos retirados do estudo para uma compreensão maior sobre o assunto. Um sobre a projeção de como pode ser a vegetação da amazônia em 2050 e outro sobre os locais da amazônia com maior potencial de colapso. O G1 não fornece nenhum elemento visual do tipo, mas incorpora ao texto dois vídeos: um do Jornal Nacional e outro da Globo News.

A reportagem do Jornal Nacional de 2minutos e 54segundos menciona que a pesquisa foi desenvolvida durante três anos, dado não citado pela Folha e nem pelo G1. Para explicar o problema, comparam visualmente a floresta amazônica com um corpo humano. “Os órgãos seriam as diferentes regiões. Pode acontecer de um órgão parar de funcionar. Depois, outro, dá um sinal de alerta, não necessariamente ao mesmo tempo. Até que esse grande corpo humano entra em colapso”, diz a narração da repórter sob uma arte gráfica que mostra a Amazônia desmatada ao fundo e um corpo humano.

O vídeo incorporado ao pé da reportagem do G1 que é da GloboNews está mais relacionado a um contexto sobre o tema. Datado de 23 de janeiro de 2024 com duração de 3 minutos e 54 segundos, a vídeo-reportagem mostra que a Amazônia Legal tem menor nível de desmatamento em 9 anos.

Entrevistas

O estudo é liderado pelos pesquisadores Marina Hirota e Bernardo Flores, da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), ambos são entrevistados tanto pela Folha quanto pelo G1, mas apenas a Folha informa que o estudo foi financiado pelo Instituto Serrapilheira.

Por meio de aspas dos cientistas, o G1 é o veículo que mais fornece informações sobre o estudo e a visão dos cientistas. Por meio de um depoimento de Hirota, por exemplo, o G1 destaca os efeitos que todas essas mudanças já provocam para as populações locais. “Essas pessoas vão sentir as consequências antes de todo o Brasil. São as pessoas que vivem na Amazônia, os povos que vivem da floresta e que mantém a floresta em pé”.

Para as demais regiões do Brasil, a devastação da Amazônia pode significar uma alteração significativa no regime de chuvas. “Há um impacto nos locais que recebem um fluxo de umidade da Amazônia. Esse fluxo abastece muitas chuvas nas Cataratas do Iguaçu, no Pantanal e na Bacia do Prata”, destaca a pesquisadora na reportagem do G1.

Contexto

Enquanto o G1 dá mais detalhes do estudo científico em questão, a Folha é quem fornece ao leitor mais contexto sobre o tema.

Logo no terceiro parágrafo, após apresentar o destaque do estudo, o texto da Folha imediatamente dá contexto a informação noticiada. “Esse ponto de inflexão para a amazônia é um dos principais focos de atenção na discussão científica sobre mudanças climáticas, em razão dos impactos para o clima, que extrapolam os limites do bioma, para a emissão de CO2 e para o modo de vida dentro e fora da região amazônica”. Na sequência, dá um panorama rápido sobre estimativas levadas em conta em outros estudos que apontam a possibilidade de não retorno com um desmatamento de 20% a 25% da floresta. E fornece o dado de que a perda da vegetação está, hoje, em uma faixa de 14% a 20%.

O texto é complementando com a informação sobre as promessas do governo Lula (PT) de zerar o desmatamento até 2030, uma meta relacionada ao compromisso brasileiro com o Acordo de Paris em limitar o aquecimento global, com perspectiva de que o aumento da temperatura não ultrapasse 1,5°C em relação aos níveis pré-industriais. Por fim, a contextualização fornecida pela reportagem aponta dados do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) dos últimos cinco anos: a amazônia perdeu 54,6 mil km2 em território brasileiro.

Após descrever sobre o estudo e demais conclusões a respeito, a reportagem relembra ainda que em 2023 a amazônia brasileira viveu uma seca histórica, “com recordes de baixas dos rios, incêndios e alteração radical do modo de vida das pessoas que vivem na região, especialmente em comunidades tradicionais”. Também aborda efeitos do El Niño e que o ocorrido em 2023 vai impactar 2024. Ao todo, são oito parágrafos de contextualização na reportagem da Folha contra dois do G1 mais um vídeo de 23 de janeiro de 2024 incorporado da GloboNews sobre a Amazônia Legal ter alcançado menor nível de desmatamento em 9 anos.