O samba paulistano

Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - UNESP Faculdade de Filosofia e Ciências de Marília

ISADORA LOPES MANZATTI E TAÍNA BAUMGRATZ GONÇALVES

Disciplina: História do Brasil II

Prof. Paulo Eduardo Teixeira

Turma 2024 ( X  ) Manhã (   ) Noite


Resumo

Este trabalho tem por objetivo, expor brevemente a história do Samba Rural Paulista e do samba paulistano, procurando compreender sua formação e suas características próprias. Optamos por dar enfoque no samba do bairro da Barra Funda em São Paulo, para dialogar com o tema da memória coletiva e como isso se dá hoje, pensando no Largo da Banana e no cordão carnavalesco “Grupo Barra Funda”. Mas é importante ressaltar que essa manifestação cultural está espalhada pelos territórios da cidade, um exemplo disso são os engraxates da Praça da Sé.


O samba paulista, tem suas primeiras manifestações no final do século XIX, em cidades como Pirapora do Bom Jesus onde ocorria o trajeto da procissão, Santana do Parnaíba e Mauá. Entre suas denominações estão o Samba Rural Paulista, denominado pelo cronista e musicólogo Mário de Andrade, o Samba Lenço de Mauá e o Samba de Bumbo, cada região possui uma característica e um sotaque próprio, mas que se encontram e não se separam de sua origem histórica comum. O Samba de Bumbo é uma característica própria do samba tradicional paulista, o bumbo está presente em outros folguedos populares como o Batuque de Umbigada e o Jongo do Vale do Paraíba, presentes em rituais de cunho religioso de matrizes africanas.

Portanto, o samba paulistano é advindo da tradição do Samba Rural Paulista, criado a partir dos bairros de moradias populares, formados na cidade de São Paulo no final do século XIX. Esses se dão pela imigração do exterior e pela migração ocorrida em diversas regiões do Brasil, especialmente pela população negra do interior paulista, em que havia uma grande concentração de escravos e descendentes dos negros escravizados da cultura de café que foram transportados para a periferia da cidade de São Paulo próximas ao centro, construindo suas moradias nos córregos e nas várzeas, como o córrego Saracura no bairro do Bexiga.

O Largo da Banana, localizado próximo à estação de trem da Barra Funda, é considerado hoje um dos berços do samba da cidade de São Paulo. O bairro da Barra Funda, na Zona Oeste de São Paulo, era um bairro popular, ocupado majoritariamente pela população negra, que em sua maioria trabalhavam como estivadores neste ponto de comércio, uma área de abastecimento e de distribuição de alimentos da cidade. Em meio a um cotidiano precário, os trabalhadores, realizavam rodas de samba e de tiririca, de onde saíram alguns sambistas que se tornaram grandes referências do samba paulistano. O lugar passa a ser reconhecido por este nome em registros oficiais, como jornais, a partir da metade do século 20 e com a construção do Viaduto do Pacaembu, ligando as marginais do Rio Tietê retificado e a região norte ao centro de São Paulo, ele desaparece devido ao processo de urbanização da cidade, que devora os bairros populares e os empurram ainda mais para as margens da cidade.

O samba está indiretamente ligado ao lugar, no sentido que as rodas de samba e a tiririca eram práticas comuns que aconteciam em momentos informais, como nos intervalos de trabalho. Todavia, era um encontro entre a população. O comércio era um espaço de grande circulação da cidade, havendo certa interação entre eles, sejam esses moradores, trabalhadores e estrangeiros. O samba paulistano estava se formando e desenhando a história da cidade, contada na visão do negro periférico, que via no samba sua cultura e suas tradições.

O samba tocado no Largo do Banana, como dito por Plínio Marcos, teatrólogo brasileiro, era uma mistura da música rural e a urbana. Agregando o samba de batuque e o samba de umbigada com os instrumentos do choro de São Paulo, resultando no samba duro, forte e batucado, sem o lirismo e a cadência característicos do samba do Rio de Janeiro, como o Samba Canção, o Partido Alto e o Samba Enredo. Um dos registros utilizados para este trabalho, foi o disco, Plínio Marcos em prosa e samba, com Geraldo Filme, Zeca da Casa Verde e Toniquinho Batuqueiro, gravado em 1974, que buscou contar a história do samba da “Pauliceia”, da cidade de São Paulo, e de sua “gente”. Pode-se dizer que estes sambistas, por meio de suas letras, realizaram um trabalho de memória, buscando falar a partir de suas visões e vivências sobre o samba característico destes territórios. Geraldo Filme, por exemplo, viveu o samba de Pirapora do Bom Jesus, o Largo da Banana e os cordões carnavalescos, sendo implantado em 2022, um monumento em sua homenagem, como uma das figuras importantes para o samba do Largo da Banana.

Dionísio Barbosa, nascido em Itirapina-SP, foi descendente de negros escravizados e chega em São Paulo durante a formação do samba paulistano. Fundou o “Grupo Carnavalesco Barra Funda” em 1914, primeiro cordão carnavalesco a circular em São Paulo. A partir desse momento, começaram a surgir novos cordões e os desfiles se expandiram para o centro da cidade, onde na década de 1930 ocorria o carnaval de rua de São Paulo. Com o desaparecimento desta manifestação, surgiram as escolas de samba e o carnaval de rua, influenciados pela tradição dos cordões carnavalescos do início do século. Mais tarde o Grupo Barra Funda é retomado por Inocêncio Tobias, sendo formado a escola de samba Mocidade Camisa Verde e Branco, em 1953.

A placa, colocada em 2021, escrita “Ponto inicial do samba paulistano, o largo que aqui havia recebeu, a partir do final do século 19, estivadores negros reunidos em rodas de samba duro e tiririca, capoeira paulista sambada”, representa o movimento dos pesquisadores do samba e dos novos sambistas, de valorizar um samba próprio, que vem se desenvolvendo e se transformando desde do início do século XX, a partir da tradição do Samba Rural Paulista. É uma tentativa de legitimá-lo, e isso se torna mais difícil com o desaparecimento do Largo da Banana e suas práticas culturais realizadas no bairro da Barra Funda.

Com a popularização do samba carioca, hoje em São Paulo predominam as canções escritas por compositores cariocas nas rodas e escolas de samba, evidenciando também uma disputa clara sobre as origens do samba. A Ala dos Compositores, por exemplo, segue hoje um modelo carioca das escolas de samba, em que não há uma grande valorização de seus compositores locais. Assim sendo, há uma perda da mobilização desta manifestação cultural, política e social, independente das composições cariocas predominarem nas rodas de samba, sem a movimentação destes grupos a partir de um trabalho da memória sobre suas matrizes históricas será difícil perpetuar esta prática cultural. O processo de uma memória coletiva, é feita no coletivo e hoje se vê poucos grupos mobilizados, tocando nas roda, o samba tradicional paulistano. Um exemplo da resistência deste movimento na cidade de São Paulo é o Samba da Vela, em Santo Amaro.

A questão central na atualidade, é que o samba tradicional não está presente na memória coletiva da população. Poucos pesquisadores e grupos artísticos estão se movimentando para realizar este trabalho de memória. A partir do momento em que esta manifestação deixa de ser fomentada, realizada e pesquisada, a cultura morre, então se faz necessário relembrar suas matrizes históricas por meio das políticas públicas culturais, da escola e da transmissão do conhecimento das culturas populares na sala de aula, dos pesquisadores e dos artistas.

Referências

MANZATTI, Marcelo Simon. Samba Paulista, do centro cafeeiro à periferia do centro: estudo sobre o Samba de Bumbo ou Samba Rural Paulista. São Paulo: PUC-SP, 2005.

SIQUEIRA, Renata Monteiro. O viaduto e o samba: o Largo da Banana, urbanização e relações raciais em São Paulo. 2022. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo.

MARCHEZIN, Lucas Tadeu. Um samba nas quebradas do mundaréu: a história do samba paulistano na voz de Geraldo Filme, Zeca da Casa Verde, Toniquinho Batuqueiro e Plínio Marcos. 2016. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo.

Links

https://www.youtube.com/watch?v=UTYJUQi2RDI

https://jornal.usp.br/ciencias/largo-da-banana-estudo-investiga-como-surgiu-e-como-desapareceu-o-berco-do-samba-paulistano/

https://jornal.usp.br/ciencias/ciencias-humanas/a-historia-do-samba-de-sao-paulo-na-narrativa-de-um-disco-de-1974/

https://mis-sp.org.br/vitrines/a-colecao-carnaval-paulistano-no-acervo-mis-sp/

https://music.youtube.com/playlist?list=OLAK5uy_nNGtiJUDD417C2A7IHPE-dQCgIYmfmInk&si=DeFxMhx0fUa3pbgM