Wikinativa/Stefanny Lopes Fernandes (vivencia Guarani 2018 - relato de experiência)
Durante o desenvolvimento das aulas, que antecederam as duas visitas para tribos diferentes, sendo a primeira para a Aldeia Guarani Tekoa Pyau, localizada na Estrada Turística do Jaraguá, e a segunda para a Aldeia Indígena do Rio Silveiras, houve a discussão e reflexão sobre as múltiplas dificuldades presentes tanto no âmbito político quanto cotidiano dos povos indígenas. Posso dizer que fomos enriquecidos nos diálogos que foram autoafirmados com dois encontros onde obtivemos a presença de militâncias indígenas em sala: uma delas de um índio pertencente a uma tribo da região nordeste do país e a outra com moradores da tribo Kariri Xocó com sua Cacique, uma liderança feminina nomeada Tanoné, pois pudemos ouvir dos próprios protagonistas a luta diária enfrentada por eles e que eu pude reconhecer nas vivências que, de fato, não importa a região do Brasil a qual a tribo esteja localizada porque os empecilhos que caem sobre as causas são, majoritariamente, os mesmos como os discutidos em sala de aula, por exemplo: a falta de saneamento básico e a contaminação dos rios que se encontram as margens dessas tribos, o histórico e dificultoso processo de demarcação de terras e, por consequência, a constante perda de identidade por não poder cultivar os saberes da floresta e das plantas que possuem. Acredito que como cidadã de um país tão miscigenado como o nosso e, principalmente, com tantas dividas históricas com o povo indígena, por exemplo, o mínimo que poderia fazer era tentar obter um pouco de conhecimento sobre algo que está intrínseco em nossa sociedade e foi por este motivo que me matriculei na disciplina de Seminários de Políticas Públicas Setoriais VI, ou mais conhecido como Disciplina Indígena, pelos alunos da Escola de Artes, Ciências e Humanidades, bem como, por estar num curso de formação de Licenciatura em Ciências da Natureza é um dever de professor estar preparado para trabalhar e discutir com a diversidade etnocultural presente em nossa realidade. Na vivência do Jaraguá nós, alunos, e todos os outros presentes, no último encontro de uma sequência que já haviam ocorrido, auxiliamos na finalização da casa de reza de um dos núcleos no qual passamos a tarde toda e foi uma experiência carregada de alegria, disposição e interatividade com os moradores da aldeia. Fomos muito bem recepcionados e, apesar de realmente sermos uma turma um pouco mais tímida, erámos constantemente convidados a interagir com o que estivesse ocorrendo, bem como havia uma abertura simpática para que isso acontecesse. A maior das dificuldades que reconheci logo de início é a falta de saneamento e limpeza que se encontra na região por culpa do descarte de lixo irresponsável da população que mora ao redor, pois nos foi relatado que ainda que os indígenas estejam a todo momento tentando preservar as terras aqueles que se encontram alheios a realidade vivida ali tratam como os núcleos presentes naquele território fossem terrenos baldios com visível desrespeito, o que é reafirmado no abandono de animais de estimação a porta das comunidades, como cachorros e gatos, e são acolhidos pelos índios. A vivência da Aldeia Indígena do Rio Silveiras foi cheia de surpresas do momento em que saímos da faculdade no dia 11 de outubro, quinta-feira, ao nosso retorno, dia 14, principalmente, para os que estiveram engajados nos grupos de oficinas, que no meu caso foi de customização de camisetas de forma que as vestimentas pudessem carregar um pouco da autoafirmação indígena. O que se sucedeu foi que, durante os quatro dias, o tempo nos presenteou com uma chuva constante que fez com que na nossa primeira noite os moradores do primeiro núcleo, no qual ficamos toda a vivência, nos cedessem a casa de reza antiga e nova para dormir. Acreditava que ao chegar lá o público com o qual nós teríamos mais dificuldade para conversar seriam as crianças, apesar de saber que há uma escola dentro da aldeia, pensei que por ser priorizado a conservação da língua materna elas teriam menos familiaridade com o português e me deparei completamente enganada pois eram elas a terem mais atitude para interagir com a turma, falando um bom português, do que nós com elas e ainda prestativas a ajudar na compreensão e conhecimento das tantas palavras que questionamos ser em sua língua. Percebi isso quando tentei umas poucas vezes conversar com as mulheres adultas onde, apesar de visualizar que elas identificavam minha fala, me respondiam em sua língua nativa. O que pôde se afirmar depois com a fala do cacique, do núcleo que fica mais próximo ao ponto turístico do rio, que os mais jovens da tribo são os que se encontram em maior desinteresse em cultivar sua identidade pois estão constantemente sofrendo com os contatos da sociedade ao redor que, verifiquei para meu espanto no segundo dia de vivência com a visita de um grupo, ainda tentam evangelizar os indígenas a todo custo, oferecendo até mesmo auxílio financeira e alimentício em troca de espaço para construção de igrejas dentro da aldeia. Os momentos de maior reflexão se desenrolaram durante todas as noites da vivência após a reza onde se discutiu sobre a necessidade de autoafirmação da identidade cultural e da resistência da qual eles tem ciência que precisam ter cotidianamente, conversas livres, onde apesar de existir uma diferença de tarefas entre homens e mulheres dentro da cultura guarani, a liberdade é igual para ambos no direito de fala, sendo que foi concedido a turma também a oportunidade de se expressar. Acredito que diante de todos os empecilhos que os grupos passaram para desenvolver suas oficinas devido a fatores externos, como o tempo, ainda que dentro dos limites possíveis todas as atividades foram proveitosas e sempre abriam mais espaço para a aproximação com os moradores da aldeia. Para finalizar, gostaria de reafirmar a importância dos diálogos e experiências proporcionadas por essa disciplina tão singular que leva os alunos para além dos muros da universidade e contribui, de forma distinta, para todas as formações desenvolvidas no meio acadêmico e na cidadania que é algo tão importante e desvalorizado por nós.