Humanidades Digitais/Aula 12
No mundo moderno, um novo tipo de subjetivação (burguesa) é produzida. Com os jornais, um novo campo de VISIBILIDADE/PUBLICIZAÇÃO é produzido e um novo uso social e político dessa visibilidade é criado. Nela, indivíduos (privados) passam a se reconhecer, de um modo novo, como parte de um PÚBLICO, ao qual devem ser submetidos assuntos de INTERESSE PÚBLICO que afetam suas vidas privadas. A publicização e a expansão da circulação das ideias (literárias, artísticas, científicas e políticas) foram sentidas desde o século XVII como uma explosão nos limites impostos pela antiga ordem à nova economia da informação. (Thompson, 1998)
“Os usos sociais dos novos bens culturais, que reuniam as qualidades da FIXIDEZ (impressão sobre papel) e MOBILIDADE (fácil transporte, armazenamento e circulação criaram as condições para que fossem apropriados na construção de diversas “comunidades textuais” ou “comunidades imaginadas”, como observou Benedict Anderson” (Brown & Duguid, 2001)
A esfera pública literária, por exemplo, foi a precursora da esfera pública política. Ela foi produzida pela transformação da arte em mercadoria e a sua liberdade de circulação para além das esferas restritas de consumo aristocrático. As novas condições sociais em meio às quais a literatura passa a ser produzida, distribuída e consumida acabam por exigir novas instâncias sociais de legitimação. Os artigos de jornais não só são transformados pelos públicos dos cafés em objeto de suas discussões...
A esfera pública é, portanto, uma REDE adequada para a COMUNICAÇÃO DE CONTEÚDOS, TOMADAS DE POSIÇÃO E FORMAÇÃO DE OPINIÕES. Essas conversações deveriam se valer da LINGUAGEM NÃO-ESPECIALIZADA capaz de tornar o DEBATE ABERTO E ACESSÍVEL a todos que estivessem dispostos a BUSCAR O ENTENDIMENTO sobre questões públicas: “...nela os fluxos comunicacionais são filtrados e sintetizados, a ponto de se condensarem em OPINIÕES PÚBLICAS ENFEIXADAS em TEMAS ESPECÍFICOS” (Jürgen Habermas – Direito e Democracia -1997 p. 92). As esferas públicas formam-se, agora, em ambientes midiáticos que se ramificam num sem número de ARENAS INTERNACIONAIS, NACIONAIS, REGIONAIS, COMUNAIS E SUBCULTURAIS.
No entanto, “é preciso levar em consideração que, para fortalecer a democracia, são necessárias NÃO APENAS estruturas comunicacionais eficientes, ou instituições propícias à participação..."; Devem estar presentes, também, “a motivação correta, o interesse e a disponibilidade dos próprios cidadãos para se engajar em debates.” (Rousiley Maia. Democracia e a internet como esfera pública virtual p. 2)
Esfera Pública Automatizada
editarPodemos dizer que há constituído um esfera publica automatizada midiaticamente? O conceito de esfera publica do Juger Habermas, salienta que a esfera publica é um espaço de interações que atua como mediador entre o Estado e a sociedade , formando a opinião publica através do consenso. Para que a opinião publica seja legitima, deve existir liberdade de expressão, de associação e reunião, o grupo que a forma, não esta a serviço do capital e muito menos se submetendo as ordens jurídicas, ou mesmo a interesses de classe e ou de negócios ou profissionais. A liberdade com responsabilidade predomina no grupo.A esfera publica é um espaço democrático amplo, e para participar nele é preciso haver respeito mutuo as diferenças de opinião.
Mas, podemos chamar essa esfera pública interconectada de uma esfera publica automatizada?
Em meados do ano de 2000, com o surgimento de plataformas de conteúdos e ampliação exponencial de acesso à internet, estudiosos ressaltaram a importância do potencial emancipatório que a mesma teria sobre a sociedade, com o surgimento de milhões de vozes interconectadas, além de ganhos financeiros. Surgiram movimentos pedindo aos juristas e ao governo americano que deixasse o ambiente da internet sem regulações, permitindo assim um ambiente de liberdade.
Aqueles que eram contrários à regulação, já previam os diversos tipo de implicações sobre a não regulação. A partir de 2010 ficou difícil ser otimista quanto a essas vozes, à liberdade que a não regulação traria e ainda quanto ao papel da internet em organizar uma esfera publica digital, nova e criticamente relevante. O que se observou foi a ascensão das maiores plataformas digitais Google e Facebook, que passam a vincular conteúdos que passam a conferir à ambas grandes lucros.
E por seu tamanho e relevância na divulgação de conteúdos digitais e participação em 75% do mercado, são nomeadas como agentes intermediários digitais, visando assim apenas a obtenção de lucro, mantendo seus algoritmos secretos, sobre o pano de fundo de segredo industrial, protegido pela lei, e funcionam ainda como filtros de tudo que o internauta poderá ter em seu feed de notícias e ou de suas pesquisas na internet.
Hoje vivemos o paradoxo da tão sonhada liberdade no meio digital contra a não regulação que muitas vezes escondem questões espúrias como misoginia, racismos, dissipação de capital, crimes de ódio, negação da verdade, e falsificação da verdade.
Mas já são notórios que devidos aos casos Edward Snodew, Wikileaks e Cambrigie Analytics, a internet e outros meios de comunicação que interferem nos direitos humanos devem ter sua regulação definida. Estamos todos vivendo dentro da caixa que essas megaempresas digitais determinam, selecionam o conteúdo que pesquisamos , coletam nossos dados, sem autorização, manipulam nossa vontade de compras e nos desestruturam psicologicamente, nos viciam em seus conteúdos, entre tantas outras coisas.
Proposta de Regulação
editarPrecisamos debater o efeito nefasto da internet, pois os benefícios já temos observado. O Facebook e o Goolge, são corporações gigantescas e influenciam na formação de novos ambientes comunicacionais e no controle de atenção. Os conteúdos que ganham repercussão, têm como métrica o número de visualização, curtidas e compartilhamentos, mas o que passa em cada um dos nossos feeds de notícias, é de fato o que gostamos ou tais conteúdos são selecionados para que nos possamos curtir, compartilhar e visualizar a partir de interesses dos anunciantes?
Dentre as propostas de regulação dessas plataformas consta:
a) Ter algoritmos auditáveis por outros algoritmos;
b) Monitoração e explicação dos resultados de busca orientadas por ódio étnicos;
c) Banir conteúdos que não atendam ou respeitem o indivíduo e o Interesse Publico;
d) Direto de respostas;
e) Limitar o poder dos agentes intermediários digitais;
f) A não coleta de dados sem consentimento.
Já temos a responsabilização do Facebook nos EUA, onde o mesmo teve que pagar a multa imposta a Cambrigie Analitics e esta decretou sua falência. O Facebook, não é apenas uma empresa intermediária de conteúdos, ela também é responsável por e pelo que publica. Acrescenta-se ainda que os governo autoritários controlam todo conteúdo publicado pelo Google e Facebook, e nesses países não há sequer esfera publica quiçá uma esfera publica interconectada.
Como diz Pasquale (2017), uma esfera pública não pode ser automatizada. Além disso, os filtros editoriais refletem valores humanos, interesses comerciais e públicos. Nos deparamos, então, com a necessidade de maior transparência e controle sobre esses espaços que devem ser colocados, eles mesmos, em debate na esfera pública.
A universalização do acesso à internet e o debate público online
editarA internet se mostra como um importante espaço aberto a conversa que se desdobra em novas conversações políticas, permitindo que seus participantes interajam localmente transcendendo barreiras físicas com discussões em nível global. Porém, inevitavelmente, a universalização da internet esbarra na barreira do acesso, pois para ser considerada universal é necessário que nenhum participante ou grupo de debate sejam excluídos de ter acesso as discussões. Essa desigualdade no acesso às tecnologias de comunicação causa grandes assimetrias entre os conectados e os desconectados.
Para discutir a barreira do acesso às tecnologias é necessário ir além das dificuldades estruturais causadas pelos elevados custos das tecnologias e expandir suas causas também ao alto índice de analfabetismo existente, principalmente em regiões periféricas. Anthony Wilhem, chama a atenção para os diferentes tipos de acesso e utilização dos meios para assim entender a lógica da exclusão digital. Segundo o autor, essas barreiras acabam por reforçar desigualdades socioeconômicas e culturais já existentes. Gerando assim um mecanismo retroalimentador, que reforça assimetrias e amplia as exclusões (Wilhelm, 2000, pp. 73-85).
Para evitar o crescimento das desigualdades criados por essas barreiras de acesso é necessário que sejam criadas políticas que garantam o acesso comunitário às tecnologias em locais públicos como bibliotecas e escolas por exemplo. Além disso, é fundamental a formação e capacitação das pessoas para que consigam utiliza-las além de uma formação discursiva que possibilite o desenvolvimento desses cidadãos para o debate público.
É relativamente utópico que apenas com o acesso total as tecnologias, tenhamos uma sociedade 100% engajada em todos os assuntos políticos, porém é possível que com o maior acesso a espaços de discussões mais pessoas se envolvam em discussões que afetem diretamente suas vidas, possibilitando ainda que parcialmente, uma diversidade maior de pensamento nos espaços de debate.
A configuração da participação virtual não segue a mesma lógica das presenciais, pois a internet possibilita que um número maior de pessoas esteja presente nas discussões de forma que não haja nenhum tipo de coação por parte do Estado. Além disso, o anonimato também é uma característica presente no ambiente virtual que pode contribuir que um número maior de pontos de vista seja levados em consideração durantes discussões, pois uma vez que as desigualdades vividas no “mundo real” não estão presentes no contexto, é possível o estabelecimento de um ambiente livre de intimidação ou medo. Entretanto, a internet também pode ser utilizada de forma hierárquica, aproximando grupos que disseminam ideias racistas e xenofóbicas, por exemplo.
Também é questionado se o debate público em meio online pode ser considerado como debate, pois é comum que se encontre comentários sem edição e sem filtros que tem como objetivo principal apenas a exposição de uma opinião pessoal e não o estabelecimento de uma prática argumentativa que leve a exposição de diferentes pontos de vista que levem a resolução de determinadas questões. Porém, havendo condições apropriadas de conexão e o interesse em participar dos cidadãos, é através do exercício do debate que será possível clarear os problemas existentes e os interesses que o envolvem, tornando as pessoas através de um processo de aprendizagem mais críticas e mais envolvidas nas questões públicas.
Referências Bibliográficas
editarLer:
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Complemento:
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Outras Leituras Complementares
Relatório do Data Privacy Brasil alerta para uso indevido de dados no combate à COVID-19
Data Privacy BR - Podcast - Dadocracia
10 Dicas de leitura para começar a atuar em Privacidade e Proteção de Dados - Data Privace BR
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Good journalism won’t be enough - Predictions for Journalism for 2018– Molly de Aguiar – NiemanLab (“If journalists want the public to listen, then journalists have to listen to the public. If journalists want the public to care, then journalists have to care about the public.”)
Fake News: Defining and Defeating – Real techniques for identifying fake news and disinformation – DFRLab, 19/01/2018
Six or Seven Things Social Media Can Do For Democracy – Posted on My heart’s in Accra May 30, 2018 by Ethan Zuckerman (*)
A Field Guide to Fake News and Other Information Disorders – Public Data Lab
How did the news go ‘fake’? When the media went social – Claire Wardle and Hossein Derakhshan -The Guardian – Friday 10 November 2017 10.00 GMT
WARDLE, Claire. Combater a desinformação é como varrer as ruas – Por Angela Pimenta Observatório da Imprensa, 14/11/2017
FENTON, Natalie, FREEDMAN, Des. Fake Democracy, Bad News. Socialist Register, 2018 ( “We are now facing a new democratic swindle in which elite media institutions – from the BBC and the New York Times to Google and Facebook – are using the crisis posed by the growth of anti-establishment politics to argue that only they are capable of sustaining a consensual, rational, and credible information ecology that can expose ‘fake news’ and protect ‘established truths’.)
ELAS VÃO HACKEAR O MUNDO – Marcela Morgado – TRIP, 05/04/2018
Mais de 20 cidades da Grande São Paulo dificultam acesso à informação pública – Agência Mural 14.maio.2018
https://jornalismonobrasilem2017.com/ (Farol Jornalismo/Abraji)
Na era do Big Data, o jornalismo de dados tem profunda importância para a sociedade - Traduzido e adaptado por Natália Mazotte do artigo “ In the age of big data, data - journalism has profound importance for society ”, de Alex Howard
Como eu me informo - Ladislaw Dowbor
Governança corporativa: O caótico poder dos gigantes financeiros - Ladislau Dowbor
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