Os mil Sertões de Euclides: nas barricadas da memória


Discente: Davi do Carmo Moreira Disciplina: História do Brasil II Professor Responsável: Paulo Teixeira 


OBJETIVOS: Não pretendo encontrar com esse artigo, a “verdade” sobre o Sertão, os sertanejos ou Canudos. Meus objetivos aqui são os de ressaltar a importância da obra de Euclides da Cunha “Os Sertões” para a memória do Arraial e do País, tanto enquanto material científico e literário, de pensar o próprio tema da memória a partir disso e identificar as influências políticas nacionais e internacionais na obra do autor.


"Canudos não se rendeu. Exemplo único na história brasileira. Resistiu até o esgotamento" (Cunha, 1995, p. 642). Essa foi a conclusão que tirou Euclides da sua expedição ao Arraial de Canudos. Porém, o caminho que ele percorre ao falar do Sertão e de seus habitantes é mais ambígua e menos elogiosa que isso.     A divisão do livro em “A Terra, O Homem e A Luta" evidência a perspectiva que o autor vai tomar na sua análise política e social do país, em especial do Sertão da Bahia: um determinismo geográfico e racial da população daquele espaço. Ao descrever o chamado jagunço, faz uso de metáforas com a vegetação árida, que surge dum terreno inóspito e é fruto da adaptação às adversidades ali presentes. Brutalidade, ímpeto, servidão, lealdade, uma casca rígida... essas são as características necessárias à toda forma de vida sertaneja, a constituição da paisagem social.     Segundo o autor, essa rigidez física e moral do sertanejo das caatingas nordestinas é fruto do avanço das Bandeiras desde o litoral até o interior do território brasileiro. Nessas expedições, a valentia dos vitoriosos bandeirantes e a rebeldia dos subjugados indígenas se cruzavam, dando origem a uma nova raça: o sertanejo. Aqui se percebe as influências do pensamento evolucionista de Spencer sobre Euclides. A visão de um condicionamento biológico e social a partir do ambiente fortaleciam organicamente o sertanejo e o enfraqueciam moralmente, sendo a união e construção de uma coletividade a única forma conhecida de sobrevivência. Percebe-se também a ausência do negro na construção desse tipo. Segundo o escritor, esses teriam se mantido mais ao litoral e, a miscigenação destes com os brancos atrelada a pouca necessidade de modificação do meio, contribuíram para uma mestiçagem mais extrema que o interior isolado geograficamente, e mais maligna. Tais diferenciações raciais trariam implicações políticas.    Dessa maneira, vê-se que é indissociável a “Terra" do “Homem” para Euclides. Um é produzido pelo outro, um território duplo: o país do Sul, do litoral, da Elite brasileira, e o país do Norte, do interior, do caipira e do jagunço. A “Luta" então, se dá no encontro desses dois países, ou parafraseando o autor, no brilhante feixe de civilização trazido da República ao anacrônico Sertão através do clarão dos disparos do revólver e da matadeira. Canudos representou o choque entre esses dois Brasis que se desconheciam. Essa é a crítica política de Euclides: ele parte do pressuposto da inferioridade racial do brasileiro, mas afirma que um projeto de nação que não leve em consideração suas particularidades (como a potência que enxerga no sertanejo apesar da mestiçagem e do fanatismo religioso) não pode passar senão de uma cópia de uma realidade europeia.     Não era justa uma pintura monarquista de Canudos, apesar de tais insurreições não serem estranhas a outras capitais, já que para Euclides os sertanejos não tinham entendimento para se filiar nem a monarquia nem a república, mas principalmente pelo fato de verem a situação por uma questão religiosa: a República era o anticristo que chegava a cobrar impostos e tomar a terra. Ainda assim, o espantalho monárquico era propagandeado pelos jornais alertando de um exército monarquista no Sertão. A luta da República contra seus inimigos imaginários, incapazes de lhe ameaçar, era mais uma mensagem, uma tentativa de hegemonia daquilo que se tornaria a memória do país, do que de fato uma expedição militar. Nesse sentido, a obra Euclidiana se ressalta enquanto um quadro de agência na memória. Apesar de sua análise determinista, teleológica pois começa na raça e termina na certeza de uma inferioridade brasileira e de sua incapacidade de evolução social, ao contar a história de Canudos e ter agência no contar dessa memória mesmo dentre as censuras do exército e dos abalos no pensamento que o Arraial provocou em si e em sua época. “Os Sertões”, assim, é uma obra contra o esquecimento da resistência popular e da tragédia que o encontrou.


CONSIDERAÇÕES FINAIS: A produção de Euclides da Cunha serve como testemunho memorial da resistência popular em especial a gerida em Canudos. Seu pessimismo político acerca do projeto de nação, que se dá pelo determinismo evolucionista principalmente, porém, pode não nos servir hoje, mas a memória produzida por ele certamente foi um marco na memória do país. A partir de sua análise outras foram produzidas tanto nas Ciências Sociais quanto na Literatura, porém com perspectivas políticas e científicas bem diferentes. Cito aqui para o exemplo, a análise de Paulo Petronilio acerca do Sertão não de Euclides, mas de Guimarães Rosa, abarcado na linguagem, mas também fugindo a ela: O Sertão roseano é uma imensa casa barroca, constituída de um turbilhão, fazendo surgir novos turbilhões dentro do Sertão.


MÉTODO DE PESQUISA: Pesquisa Bibliográfica 


BIBLIOGRAFIA: Os sertões e os (des)caminhos da mudança social no Brasil (MJ Rezende, 2001); A geografia da diferença nas veredas de Guimarães Rosa (PP Correia, 2013); Os Sertões (Cunha, 1997)

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