Introdução ao Jornalismo Científico/História da Ciência e da Tecnologia/Antes da Ciência, veio a Técnica
Antes da Ciência, veio a Técnica
Como mostramos, o conhecimento sobre nossa espécie cresceu bastante nas últimas décadas. Até dois séculos atrás, não havia o conceito de processo evolutivo do ser humano. A parte da Pré-História é complicada de ser investigada, justamente por não haver registros escritos daquela época. A mais aceita sobre o surgimento do Sapiens é que somos resultado de uma miscigenação entre as espécies de gênero Homo. A ideia de uma evolução linear, na qual uma espécie substitui a outra, caiu em descrédito especialmente após as estimativas geradas pelas técnicas de datação, que apontam que o Sapiens conviveu e cruzou com Neanderthalensis, Floresiensis e outros.
As espécies do gênero Homo conseguiram mexer com o fogo, criar ferramentas e utensílios para variados fins, inclusive para a pesca e a caça. Começamos a gastar menos energia para caçar e menos ainda para comer, já que a carne cozida é de mais fácil digestão. Assim, sobrava mais energia para outras coisas. A teoria mais aceita diz que surgimos na África e de lá saímos para conquistar o mundo, em três fases. A primeira teria ocorrido com os Erectus, que se espalharam pela Ásia e deram origem aos Floresiensis, encontrada apenas no sudeste asiático, quase na Oceania. Então foi a vez dos Heidelbergensis deixar a África e dar origem aos Neandertais e ao hominídeo de Denisova, espécie recém-descoberta que ainda sequer recebeu classificação. Por fim, a terceira partida, com os Sapiens, que exploraram o mundo e se misturaram com as espécies em seu caminho. Não à toa, entre 1% e 3% dos genes de todos os seres humanos têm traços dos Neandertais, com exceção às pessoas de ascendência exclusivamente africana, cujos genes são 100% Sapiens.

Há características que distinguem os Sapiens das outras espécies do gênero Homo, a começar pelo cérebro, cuja área cortical associada a memória, previsão, motivação e imaginação aparece melhor desenvolvida do que em relação aos parentes mais velhos. O volume de nosso cérebro, em média 1350 cm3, é muito maior do que os 450 cm3 do Australopithecus, por exemplo, mas tem as mesmas dimensões que o do neanderthalensis. O crescimento cerebral foi importante, mas o que de fato influenciou foi uma pequena área dele. Outra importante mudança corpórea é na região da faringe, cujo comprimento é maior do que a de outras espécies e isso permitiu-nos desenvolver os sons necessários para uma fala articulada. Aqui está talvez a principal diferença do ser humano, Sapiens Sapiens, em relação a qualquer outro animal: linguagem falada. O neanderthalensis, que não é nosso ancestral, tinha uma faringe muito menor.
O Homo Sapiens surgiu há 300 mil anos e os autores costumam dividi-lo em duas subespécies: o primitivo Sapiens, primeira fase de nossa evolução que durou até a 40 mil atrás, quando desenvolvemos a fala e o pensamento abstrato, características comuns aos Sapiens Sapiens. Dos primitivos, herdamos o conhecimento de caça, pesca e coleta, as técnicas de construção e uso de ferramentas, além do essencial domínio do fogo. Gritos e grunhidos de dor e medo tornaram-se uma linguagem oral de fato, começamos a transmitir conhecimento e tentar expressar o que sentimos, coisas que fazemos desde então.
Passou um longo período entre o desenvolvimento da fala e a criação da escrita, quando o processo evolutivo tornou-se acelerado. Tornamo-nos curiosos, observativos e com a capacidade de inovar: as técnicas eram aperfeiçoadas rapidamente, aprendemos a viver em um meio hostil e desconhecido. Criamos a primeira tecnologia de todas: a agricultura. Nesta fase da Pré-História ainda não havia Ciência como a conhecemos, do espírito crítico e analítico, mas ela é de fundamental importância para a compreensão da História da Ciência e da Tecnologia. Apresentaremos brevemente os 40 mil anos anteriores à invenção da escrita, separados em dois eixos: Período Neolítico e Idade dos Metais.
Período Neolítico:Editar

Também conhecido como Período da Pedra Polida, foi uma época em que houve significativas mudanças no modo de vida dos humanos. Segundo estudos sobre a pré-história, o período Neolítico seria a parte final da Idade da Pedra, que se inicia com o Paleolítico e passa para o Mesolítico antes de chegar ao Neolítico. Os desenvolvimentos ocorreram em populações espalhadas pela Terra, mas não simultaneamente, e cada uma com suas idiossincrasias. Os agrupamentos humanos cresciam e aumentavam as dificuldades de locomoção e subsistência dos indivíduos. Aventurar-se por regiões desconhecidas em busca de animais para caça tinha um risco inerente que não compensava pela quantidade de comida que conseguiam. Da necessidade veio a primeira inovação tecnológica humana, há 13 mil anos: a agricultura. Com isso, passamos a ficar em um lugar só; éramos nômades, viramos sedentários. As regiões próximas a rios eram as preferidas. Na China e no sudeste asiático, os rios Amarelo e Indo receberam populações que cultivavam arroz e sorgo. No sul da Europa e na região da Mesopotâmia -- que significa "terra entre rios" --, as populações plantavam trigo, cevada e leguminosas. Na América Central e região dos Andes, milho, feijão e batata eram os produtos cultivados pelas comunidades locais.
Uma questão recorrente sobre esse assunto é: como populações separadas geograficamente, sem contato entre si, tiveram semelhantes progressos técnicos em tempos distintos? A resposta mais aceita entre os pesquisadores é que a invenção é resultado da combinação da necessidade de uma sociedade mais o meio e a época na qual ela se encontra. Com a agricultura, o Sapiens passou de nômade para sedentário e seus grupos, que eram constituídos por uma só família, tornaram-se multifamiliares. A lista de utensílios e técnicas criados nesta época é extensa: jarras e potes para estocagem, tijolos para as moradias, tecidos como linho e lã que tornaram as vestimentas mais confortáveis, tal qual o curtume e o uso do couro, a domesticação de animais, desde cavalos e camelos à renas e cães, além da invenção da roda, da roldana e de rolos, que ajudaram na movimentação de objetos pesados.
Idades dos Metais:Editar
As invenções técnicas melhoraram a vida das pessoas e modificaram a organização social das comunidades, cujo crescimento populacional acentuado tornou-as mais complexas. Pode-se dizer que elas passaram por um processo de urbanização, não como conhecemos hoje, mas no sentido de que os papéis sociais e as estruturas físicas tornaram-se mais complexas. Os locais nos quais as comunidades se fixaram foi essencial para que fosse estabelecido comércio entre elas. Além disso, desenvolveu-se a técnica de mineração de metais, o passo inicial para a Metalurgia, cujo produto, o metal, é bem mais resistente do que os conhecidos àquela época.


A evolução criativa do ser humano nos milhares de anos finais da Pré-História foi enorme. Ela acontecia como resultado da prioridade número um das pessoas: sobreviver em um mundo hostil e desconhecido, onde a preocupação era tão somente melhorar as condições de vida. A natureza e seus fenômenos encantava e apavorava: a observação era feita, claro, mas não havia um método ou sistema para explicar os acontecimentos. Desta maneira, entrava em ação a imaginação humana, que tentava justificar chuvas e tremores de terra, por exemplo, a partir de uma vontade sobrenatural e alheia às pessoas, pertencente ao mundo dos espíritos. Não havia problemas para a compreensão do que estava ao seu redor. Saber e crer em um poder superior, controlador da natureza, satisfazia as sociedades que, quando necessitavam de algum tipo de resposta, recorriam ao curandeiro, ao mago e ao feiticeiro, os quais sabiam como interpretar a vontade dos espíritos e ditavam às pessoas os ritos e costumes de adoração.
Nos anos finais da Idade dos Metais, o comércio envolvia grandes quantidades de produtos, e o conhecimento acumulado no desenvolvimento da técnica era incapaz de ser absorvido pela memória apenas pela oralidade. Surgiram, então, duas inovações fundamentais para sermos o que somos: a contagem e a escrita de signo. A contagem servia para pesar, medir volume e a área, e acredita-se que envolvia somente soma e subtração. As civilizações usavam-na essencialmente no controle do estoque e no comércio. Quanto a escrita de signo, com base nas tábuas de Uruk, estima-se que ela surgiu 3,5 mil atrás diante da necessidade de registrar os acontecimentos e os conhecimentos técnicos desenvolvidos.
Apesar todo o salto evolutivo que ocorreu a partir do momento em que desenvolvemos a capacidade de falar, há cerca de 40 mil anos, não é possível dizer que a Ciência foi criada na Pré-História, tendo em vista a necessidade da escrita para o estabelecimento de um conhecimento científico. Ademais, faltava às civilizações da época o espírito científico, analítico e crítico fundamental para a Ciência. Ter a capacidade de contar e subtrair se assemelha à abstração matemática, mas não pode constituir uma Ciência Matemática, do mesmo modo que saber quais plantas são comestíveis não equivale ao saber da Botânica. A Técnica, portanto, precede a Ciência. Ela precede inclusive a nossa espécie, Homo Sapiens Sapiens.
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